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Arquitetos e Engenheiros: a eterna luta dos desesperados

© Depositphotos.com / vician A falta de credibilidade na profissão de arquiteto tem se tornado preocupante.

Alguns afirmam que Deus seria o primeiro arquiteto, pois é o criador do universo, do planeta Terra e de tudo que nele habita. Apesar desta crença, sabe-se que nenhum humano arquiteto é deus. Não lhe cabe o direito de impor, de forma autoritária, o seu trabalho e as suas ideias sem que haja brechas para questionamentos e mudanças. Porém, a falta de credibilidade na profissão pode ter atingido níveis perigosos. A eterna rixa entre aqueles que atuam no mesmo nicho de mercado confundem não somente os clientes como também os profissionais na área.

Recentemente, na tentativa de esclarecer empregadores, de órgãos públicos e privados, sobre as atribuições cabíveis aos arquitetos, o CAU/BR (Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil) lançou um documento explicativo que gerou sérios comentários nas redes sociais. Nele o conselho defende os honorários mínimos para os diferentes serviços que estes profissionais exercem e também destaca que somente graduados no curso superior de Arquitetura & Urbanismo podem realizar Projetos Arquitetônicos. Apesar da similaridade entre as nomenclaturas, a ideia não parece óbvia para a maioria da população. Criou-se uma cultura ignorante que separa em polos distantes os engenheiros civis dos arquitetos.

Infelizmente, contrariando o significado e a importância que a profissão tem na maioria dos países ao redor do mundo, aqui no Brasil os arquitetos têm lutado incansavelmente durante anos contra a ideia de que seu conhecimento limita-se apenas à estética. Na verdade, vai muito mais além, chegando às especificações de técnicas construtivas e execução de obras. Entre os menos esclarecidos, ainda pode-se ouvir a velha história de que arquitetos só poderiam projetar edificações de pequenas metragens e poucos pavimentos. Isto é mito.

Durante o treinamento profissional, os estudantes de arquitetura aprendem como lidar com as questões estéticas e complementares de um projeto. Estuda-se história, artes, cálculo estrutural, sistemas elétricos, hidrossanitários, conforto ambiental, comunicação visual entre outros. Já formado, ele pode se dedicar desde os projetos de ambientes e de restauro do patrimônio até o paisagismo e urbanismo de uma cidade. Ou seja, ele lida do micro ao macro, da pequena à grande escala. Mesmo em grandes empreendimentos o arquiteto pode ser o responsável pelo gerenciamento da obra.

Alguns setores optam pela contratação de engenheiros, pois estes lidam de forma mais racional com as questões físicas e matemáticas. São atribuições exclusivas dos engenheiros civis projetos de pontes, viadutos e estradas. Porém, o trabalho dos arquitetos e dos engenheiros se cruza em muitos pontos. No dia-a-dia, os arquitetos podem ser mais os seus parceiros do que os seus concorrentes. São profissões que se complementam. Exatamente por este motivo é que, até poucos anos atrás, ambos eram representados e regulamentados por uma mesma entidade, o CREA (hoje, Conselho Regional de Engenharia e Agronomia). A criação de um novo conselho pode ter separado ainda mais as profissões.

Pensando em dar mais ‘voz’ às questões arquitetônicas, pouco representadas pelo antigo conselho, a criação do CAU parecia ser uma boa oportunidade de desfazer enganos e ajudar a direcionar setores. Porém, um texto lançado em uma das páginas do CREA no Brasil, nesta semana, mostra que esta rixa está longe de chegar ao fim. Em nota, um de seus representantes dizia-se preocupado e desaconselhava clientes a contratarem arquitetos, colocando em dúvida a capacidade destes profissionais e desmerecendo a sua atuação em algumas áreas da construção civil.

Outro impasse vem ocorrendo entre o Governo Federal e os representantes de profissionais formados por cursos de nível médio, como o Técnico em Edificações, e superior, como o Design de Ambientes ou Interiores. Alguns pedem a regulamentação destas profissões, o direito à representatividade e de execução de projetos civis. Esta proposta, por hora, foi vetada. Entendeu-se que o pouco tempo de estudo e abrangência de conteúdos nestes cursos não são apropriados ao mínimo necessário para esta realização. As grades curriculares das faculdades de Engenharia Civil e Arquitetura & Urbanismo são mais bem preparadas e visam melhor à capacitação para a execução de tais projetos, garantindo o conhecimento aprofundado e abrangente, ao contrário dos demais cursos.

Resumidamente, esta é a eterna luta dos desesperados. A falta de oportunidades faz com que todos busquem o seu lugar à sombra, de uma forma ou de outra. O mercado oferece poucas vagas e exige qualificação, mas às vezes ela é muito cara e demorada. Então, alguns tentam trilhar o caminho mais curto, através de soluções aparentemente fáceis. O risco maior fica para os clientes que, na ignorância, acabam contratando serviços de profissionais sem conhecimento adequado, sem experiência e sem responsabilidade legal. Pela legislação brasileira somente bacharéis em Engenharia e Arquitetura podem responder tecnicamente por projetos e execuções de obras civis. A indicação, em documentos oficiais e peças publicitárias, sobre a responsabilidade técnica do profissional é obrigatória em obras e empreendimentos imobiliários, garantindo a autoria e o reconhecimento do seu trabalho.

É fundamental que estes conselhos e seus representantes cheguem a um consenso rápido e informem adequadamente a sociedade brasileira sobre os justos direitos de cada profissão. A promoção da prática de um profissional não pode infringir as leis e nem desmentir as atribuições privativas de outro, estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação. O que deve ser discutido não são as suas competências e habilidades, mas o controle e a fiscalização de seus atos pelas administrações públicas, garantindo a segurança da sociedade brasileira.

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